domingo, 16 de maio de 2010
BASES BIOLÓGICAS DA ESPIRITUALIDADE
Até que ponto uma experiência espiritual é incompatível com uma experiência racional? Para estudar a questão, vem se firmando uma nova disciplina científica, voltada para estabelecer os processos que se ativam no cérebro no momento em que ocorrem experiências espirituais: a neuroteologia.
BASES BIOLÓGICAS DA ESPIRITUALIDADE
A neuroteologia é uma nova disciplina científica, que procura definir os processos que se ativam no cérebro no momento em que ocorrem experiências espirituais, como durante uma experiência mística ou transcendental, durante os momentos de oração ou quando a pessoa acompanha um ritual religioso. Existem hoje novas tecnologias e novos instrumentos que permitem observar o cérebro durante esses processos, como o SPECT (Single Photon Emision Computed Tomography), a tomografia por emissões simples de pósitrons. Os chamados "neuroteologistas", como James Austin, partem dos relatórios de experiências realizadas por diversas pessoas. Se, por exemplo, numa
experiência mística o medo e a consciência de si mesmo desaparecem, quais circuitos cerebrais impedem que eles se manifestem? Os circuitos do lóbulo parietal, onde se encontra a orientação espacial e onde se estabelece a diferença entre si mesmo e o mundo, deixam de funcionar. Também os circuitos dos lóbulos frontais e temporais, onde encontramos o sentido do tempo e nosso "eu temporal", ficam inoperantes. A partir de 1998, um número crescente de cientistas tem-se dedicado a essa nova disciplina, e, para tanto, muito colaboraram os trabalhos de Andrew Newberg e Eugene d'Aquili,pesquisadores da Universidade da Pensilvânia, Estados Unidos, e autores do livro "Por que Deus ainda não foi embora?". Nele são estabelecidas as primeiras conclusões dos estudos feitos com monges budistas em estado de meditação e com freiras franciscanas em processo de profunda oração. Newberg e d'Aquili conseguiram descobrir a maneira pela qual durante a meditação a parte superior do lóbulo parietal é ativada. Essa região, a que deram o nome de "área de orientação e associação", seria a que processa a informação sobre o espaço e o tempo, ou seja, "onde termina o corpo e começa o resto do mundo". O interessante dessas primeiras observações é que tanto com os monges budistas quanto com as religiosas franciscanas ocorreu o mesmo tipo de alterações cerebrais. Além dessas descobertas conseguiu-se estabelecer que é no lóbulo parietal que se encontra o sentido da unidade cósmica. No lóbulo frontal situa-se a área de atenção que é ativada durante a meditação. Na conjunção dos lóbulos parietal, temporal e frontal fica um centro de resposta às palavras religiosas. No lóbulo temporal se encontrariam os aspectos emocionais da experiência religiosa, e entre os lóbulos temporal e occipital fica a área que se relaciona com o aspecto das imagens religiosas (velas e cruzes, por
exemplo). Michael Persinger, da Universidade Laurenciana, em Ontário, Canadá, foi
ainda mais longe. Criou um capacete pelo qual passa uma leve corrente eletromagnética, para demonstrar que as sensações religiosas podem ser reproduzidas. Muitos voluntários que participaram da experiência de Persinger disseram que ao usar o capacete tiveram uma experiência mística, uma sensação de que havia alguém por perto; alguns choraram e outros sentiram-se próximos a Deus. Embora possa não ser surpreendente o fato de as experiências espirituais terem uma correlação neurológica (já que todas as experiências humanas a têm), os neuroteologistas não crêem que a questão seja tão simples. Eles querem aprender por que essas experiências não ocorrem com todas as pessoas, como se consegue chegar a tais experiências, e por que as espirituais têm as características que as fazem tão interessantes. Os estudos de neuroteologia têm causado polêmicas entre os religiosos. Alguns teólogos assinalaram que em tais estudos costuma-se confundir espiritualidade com religião, e que religião é um assunto muito mais amplo que a simples experiência espiritual. Kenneth Woodward, editor de assuntos religiosos do semanário Newsweek e um dos que pensam dessa maneira, pergunta se amar o próximo é uma questão biológica, ou que possa ser reduzida a uma questão meramente biológica. Apesar dessas críticas, muitos neuroteologistas acentuaram que o simples fato de a experiência espiritual ter um componente neurológico não significa que ela ocorra apenas no cérebro ou que seja parte de uma atividade cerebral independente da realidade. Existem, finalmente, os que tentam de alguma maneira conciliar essas novas descobertas com as doutrinas clássicas sobre religião. É o caso de Robert K.C. Forman, especialista em religião comparada do Hunter College, de Nova York, para quem, como nem todos os que meditam são capazes de alcançar uma experiência transcendental, existiria um determinismo genético na constituição de certas pessoas que lhes permitiria alcançar tais estados. A discussão está apenas começando e os neuroteologistas admitem que suas conclusões não são definitivas e que o caminho é longo e complexo. Seja como for, a pergunta de muitos cientistas propicia um debate muito interessante:
"O ser humano é religioso porque conta com as estruturas biológicas que lhe permitem essas características?". E a essa indagação juntam-se outras: tais estruturas se formaram como parte de um processo de evolução natural? Se a natureza nada deixa ao acaso, essas estruturas são naturalmente necessárias ao ser humano ou de um ponto de vista religioso? Deus criou essas estruturas para que o ser humano seja capaz de ter uma vivência da divindade?
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